Ao longo dos anos, entre provas de vinho e conversas acesas, fui desmistificando algumas questões sobre o vinho verde em Portugal, um vinho tão famoso quanto mal compreendido.
Assim, e depois de já ter escrito extensamente sobre o vinho do Porto e sobre as melhores quintas do Douro, chegou a vez de fazer um guia sobre o vinho verde.
Qual a melhor forma de chegar à região dos vinhos verdes em Portugal?
Ao contrário do Douro, onde é possível chegar às cidades principais da região de comboio, tal não é possível na região dos vinhos verdes.
É certo que há ligação para as cidades de Braga e Guimarães, que tecnicamente pertencem à região dos vinhos verdes, mas se quiser explorar as suas melhores vinícolas precisa definitivamente de carro, já que estas se encontram concentradas na região de Monção e Melgaço (casta Alvarinho), Ponte de Lima (casta Loureiro) e Amarante (castas Avesso e Arinto).
Por isso, ou contrata um guia privado como eu ou então aluga um carro para explorar a região dos vinhos verdes.
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Desfazendo os mitos sobre o vinho verde…
1. O vinho verde não é um vinho maduro
Quando vamos a um restaurante, é bastante comum que o empregado de mesa nos pergunte se queremos um vinho “maduro branco” ou “verde branco”, o que nos induz no erro de pensar que o vinho verde não é um vinho maduro.
Na realidade, é – mas para compreender melhor a denominação “verde”, é pertinente recuar no tempo e perceber como é que o vinho verde era produzido antigamente.
Segundo Joana, uma das enólogas da Casa de Cello, antigamente os campos eram utilizados essencialmente para plantações de milho e batata, sendo as vinhas plantadas à volta das mesmas, em bordadura. Assim, as uvas não recebiam tanta exposição solar pelo que não maturavam inteiramente, sendo, efectivamente, uvas verdes 🙂
A plantação em bordadura é bastante evidente nesta fotografia, retirada do website da CVRVV.
Hoje em dia é completamente diferente. A aposta na produção de vinhos verdes per si aliada à evolução tecnológica permite a plantação de videiras de forma a que as uvas recebam a exposição solar de que necessitam para uma maturação completa. Assim, os vinhos verdes não são vinhos imaturos, mas sim brancos, tintos ou rosés, como qualquer outro tipo de vinho.
2. O vinho verde nunca passa pela madeira
A maior parte do vinho verde comercializada hoje em dia efectivamente não “passa pela madeira”, ou seja, durante o seu processo de produção não estagia em madeira. Em vez disso, todo o processo de vinificação dá-se em cubas de inox.
No entanto, já existem alguns produtores de vinho verde a produzir vinhos “com madeira”.
Nomeadamente, a Quinta do Soalheiro com o seu premiado 2014 Alvarinho Soalheiro Reserva, um vinho 100% fermentado em casco de carvalho que recebeu a medalha de prata no Decanter World Wine Awards 2016 e a Quinta do Ameal, por exemplo, com o seu magnífico Escolha, que estagia durante 6 meses em barricas usadas de carvalho francês de Nevers. Vinhos excepcionais que pedem alguma paciência para revelarem os seus aromas e sabores e, de preferência, harmonizados com uma refeição elegante.
3. O vinho verde é sempre fresco, frutado e floral
A comunicação da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes posiciona os vinhos verdes como “frescos, frutados, florais”, algo que remete imediatamente para um consumo (quase) diário durante os meses mais quentes do ano.
Não é uma comunicação errónea, tendo em conta que a maior parte dos vinhos verdes produzidos hoje em dia correspondem precisamente a esse perfil – fresco, frutado e floral.
No entanto, existem produtores que provam que os vinhos verdes podem ser mais do que isso. A invulgar Casa de Cello, pelas mãos do João Pedro Araújo, gaba-se – e com todo o mérito! – dos seus “vinhos sérios, vinhos secos”.
Outro excelente exemplo de um produtor que se atreve à diferença é Pedro Araújo, da Quinta do Ameal, que se afirma como um produtor de grandes vinhos brancos, fugindo à conotação habitual dos vinhos verdes.
Exemplos de que na mesma região se podem produzir vinhos que satisfaçam diferentes perfis de consumidores em diferentes momentos de consumo, abrangendo desde vinhos mais acessíveis, disponíveis nos supermercados, a vinhos que se encontram nas cartas de vinhos de alguns dos melhores restaurantes do mundo.
4. O vinho verde é sempre branco
Este mito foi desfeito com um grande esforço da minha parte, confesso. Nalgumas zonas do Minho, onde se situa a região demarcada dos vinhos verdes, é muito comum o consumo do “vinhão”. O “vinhão” é uma casta tinta também conhecida por sousão no Douro, onde é usada maioritariamente pela sua coloração (a película e a polpa desta casta são tintas, pelo que conferem uma cor mais acentuada ao vinho).
Na região dos vinhos verdes, ao vinhão é concedida a honra de ser consumido numas malgas características que acompanham a refeição. Após várias tentativas infrutíferas da minha parte, posso afirmar que os vinhos verdes nem sempre são brancos… mas preferia que fossem!
Afinal, o que é um vinho verde?!
Depois de desfazer todos estes mitos, voltemos ao princípio. Os vinhos verdes não são mais do que os vinhos produzidos na região vinícola demarcada dos vinhos verdes, com todas a variedade e complexidade que isso implica. Esta região foi demarcada a 1 de Outubro de 1908.
É a maior região demarcada de Portugal, localizada a noroeste, fazendo fronteira com Espanha, com as províncias do Minho e com as do Douro Litoral. É dividida em nove sub-regiões, como podem ver no mapa abaixo indicado.
A região demarcada dos vinhos verdes contém 20.000 produtores (em contraste, por exemplo, com a região demarcada do Douro, que tem mais de 30.000 produtores), com uma produção anual de 80M de litros de vinho que se dividem em cerca de 2000 marcas.
Já agora, por curiosidade… sabia que os vinhos verdes foram os primeiros vinhos portugueses conhecidos a nível europeu, nomeadamente pelo Reino Unido? Aliás, antes mesmo de o Douro Vinhateiro ter sido “descoberto” pelos ingleses, já se exportava vinho português minhoto para o Reino Unido… 🙂
As melhores vinícolas de vinho verde em Portugal são:
Quinta do Soalheiro (Sub região de Monção e Melgaço)
4960-010 Alvarado | Melgaço
A Quinta do Soalheiro é uma empresa familiar que produz vinhos verdes da casta alvarinho desde 1982. É uma empresa com uma visão muito própria, focada na marca e não apenas na casta alvarinho (alvariño, em espanhol), uma vez que, muito provavelmente, esta casta vai deixar de ser produzida exclusivamente na sub região de Monção e Melgaço para se alastrar à restante região demarcada dos vinhos verdes.
A Quinta do Soalheiro tem um portfolio de vinhos bastante abrangente, desde monovarietais de alvarinho, blends de alvarinho e loureiro (outra casta da região dos vinhos verdes), Terra Mater – um vinho biológico que estagia em barricas de castanheiro – e até um espumante bruto produzido de acordo com o método tradicional.
A visita à adega é feita na Quinta do Soalheiro, sendo que a prova dos vinhos é feita na belíssima Quinta das Folgas, a apenas alguns minutos de distância (de carro).
Existem vários tipos de provas na Quinta do Soalheiro, que variam entre os 6€ e os 65€ / pessoa. Se quiser incluir uma visita à Quinta da Folga com harmonização de vinhos com enchidos caseiros (alheira de porco bísaro, presunto, paio, chouriça de sangue) e legumes da horta própria, a prova fica, naturalmente, mais cara.
O local de provas é lindíssimo, e, se estiver um dia soalheiro, peçam para fazer a prova nas mesas do terraço – assim aproveitam a vista fabulosa enquanto desfrutam do vosso vinho 😉
Reservas: através do email quinta@soalheiro.com ou do contacto +351 251 416 769.
Palácio da Brejoeira (Sub região de Monção e Melgaço)
4950-660 Pinheiros | Monção
O Palácio da Brejoeira é absolutamente magnífico e aconselho vivamente que o visitem, pelo espaço e pela história em si.
Após passar por várias ilustres mãos, em 1937 o Palácio da Brejoeira foi adquirido por Francisco de Oliveira Paes, um rico comerciante de Lisboa que o ofereceu como presente de aniversário à sua filha Hermínia, quando esta fez 18 anos. Hermínia, que faleceu há uns anos, foi uma mulher pioneira na produção da casta alvarinho, tendo mandado plantar 2hec desta casta em 1964.
Uma mulher de negócios, viajada, e feliz, que dizia que “o Alvarinho é o meu filho”.
As visitas ao Palácio da Brejoeira são feitas em português, inglês e francês. Tipo de visitas:
- Interior do Palácio da Brejoeira, capela e jardins.
Duração: 30min. - Exterior do Palácio da Brejoeira (só bosque, adega antiga e vinhas).
Duração: 30min. - Interior e exterior do Palácio da Brejoeira.
Duração: 60min.
As degustações são pagas à parte das visitas:
– Vinho: 2.5€
– Aguardente bagaceira: 3€
– Aguardente velha: 3€
Horários:
[9h30 – 12h30] + [14h30 – 18h30]. De manhã, a última visita de 30m tem início às 12h e a última visita de 1h tem início às 11h30. De tarde, a última visita de 30m tem início às 18h e a última visita de 1h tem início às 17h30.
Reservas: através do email recepcao@palaciodabrejoeira.pt ou do número +351 251 667 238, embora também aceitem visitantes “de passagem”, caso o grupo seja pequeno e mediante disponibilidade de guias nesse dia.
Distribuidores dos vinhos do Palácio da Brejoeira:
Brasil – Vinci – Importadora e Exportadora de bebidas Lda.
Quinta do Ameal (Sub região de Lima)
4990 – 707 Refóios do Lima | Ponte do Lima
A primeira referência à Quinta do Ameal data de 1710, como sendo uma propriedade pertencente a um antigo convento, mas, naturalmente, a produção de vinhos arrancou quase três séculos mais tarde, em 1990, pelas mãos de Pedro Araújo, que desde o início apostou na produção de excelentes vinhos brancos.
Aposta ganha, digo-o sem grande risco, já que, por exemplo, o Quinta do Ameal – Clássico recebeu 94 pontos na escala de Robert Parker, que detém a conceituada revista The Wine Advocate. A Quinta do Ameal foi também eleita, em 2015, para a prova “Matter of Taste” de Robert Parker, no qual participam apenas 200 vinhos selecionados em todo o mundo.
E, porque nunca é demais referir isto, esta propriedade tem vinhos nalguns dos mais conceituados restaurantes com estrelas Michelin, tal como o Petrus, em Londres.
A Quinta do Ameal é lindíssima e inclui, para além das vinhas em si, duas casas de turismo, uma piscina exterior, um bosque de magníficos pinheiros mansos, vários jardins e uma adega. É um espaço onde o tempo corre mais devagar, entre vinhos belíssimos e conversas amenas à volta da lareira.
Reservas: através do email quintadoameal@netcabo.pt ou do contato +351 916 907 016, e realizam-se em português, inglês, espanhol e alemão.
Casa de Cello (Sub região de Amarante)
4605-118 Vila-Meã | Amarante
A Casa de Cello é outra carta completamente fora do baralho na região dos vinhos verdes. Quer pela sua filosofia de produção de vinhos, que aposta fortemente no cuidado extremo durante a viticultura (irrigação, arejamento da produção, poda, etc) de forma a ter uma menor intervenção na adega, produzindo vinhos mais naturais, onde as características do terroir se expressam de forma mais evidente.
Tipicamente, a Casa de Cello não recebe visitas que não as dos seus clientes e distribuidores, mas, se quer o meu conselho, passe por lá de qualquer forma, que aposto que será tão bem recebido como nós fomos. Terá a oportunidade de provar alguns vinhos bastante invulgares, como, por exemplo, o Casa de Cello Superior, de 2009, um blend da casta Alvarinho com Malvasia Fina.
Distribuidores da Casa de Cello:
Brasil – Emporio Fernandes e também nos restaurantes fornecidos pela TW Wines.
Onde ficar na região dos Vinhos Verdes
Na minha opinião, existem três lugares principais para ficar na região do vinho verde:
- Em Monção ou Melgaço, a sub-região mais importante para a produção da famosa uva Alvarinho. Lá, sugiro o lindíssimo Solar de Serrade, o Hotel Fonte da Vila ou a Casa da Vinha (fica a 30 minutos de carro de Monção, mas é impressionante). Se está com um grupo de amigos ou com a sua família, eu recomendo fortemente a Casa das Pesqueiras, em Melgaço – uma casa grande e muito confortável que ainda tem churrasqueira e piscina!
- Em Ponte de Lima, a sub-região perfeita para a casta Loureiro. Aí recomendo a Quinta do Ameal, a Casa de Anquião ou o adorável apartamento Mercearia da Vila.
- Em Amarante, à beira do rio Douro. Adoro o Monverde Wine Hotel, o elegante Hotel Casa da Calçada, o apartamento Mimo House, e o Des Arts Hostel (um albergue muito acessível).