Locais históricos no Porto (e tu nem suspeitas!)

Há artigos que não se escrevem; vão-se escrevendo, ao ritmo das tardes chuvosas, da hora passada à espera de uma…

Sara Riobom
11 de March de 2018

Há artigos que não se escrevem; vão-se escrevendo, ao ritmo das tardes chuvosas, da hora passada à espera de uma consulta, no tempo anterior a um café a muitas vozes. Há temas que exigem tempo para florescerem palavras, e este é um deles: os locais históricos no Porto. Espero que gostem 🙂

Aqui estão alguns dos locais históricos no Porto…

Praça Carlos Alberto

© www.olhares.sapo.pt

Já aqui tinha escrito sobre a Praça Carlos Alberto, um local de azáfamas diárias, cheio de cafézinhos e restaurantes, e onde decorre a feira Porto Belo aos sábados.
No entanto, o que muita gente não sabe é que esta praça foi palco não apenas de um, mas de dois momentos excepcionais que fazem deste um dos locais históricos do Porto:

  • o asilo do rei Carlos Alberto, rei da Sardenha, no Porto, corria o ano de 1849 – facto inédito para a cidade burguesa que é o Porto, que pelo espanto renomeou Praça Carlos Alberto a que era então conhecida por Praça dos Ferradores.
  • a candidatura do General Humberto Delgado para a presidência da República em 1958 contra o candidato do regime, Américo Tomás. Num clima de medo e repressão o Porto mostrou-se digno do General Sem Medo, recebendo-o em apoteose na estação de São Bento e conduzindo-o à sua sede de candidatura, precisamente na Praça Carlos Alberto, por cima do Café Luso. Milhares de pessoas – há relatos de 100.000 pessoas e outros de 200.000 – esperaram que Humberto Delgado discursasse para a população, o que ele fez, comovido, sem esquecer um largado elogio à tradição liberal do Porto:

“Sinto-me deslumbrado! Esta gente do Porto, insubmissa à tirania, acaba de me mostrar a luminosa estrada da Liberdade. O meu coração ficará no Porto, já que no Porto nasceu, como noutros momentos históricos, o indomável espírito de luta que só terminará com o triunfo da liberdade em Portugal”.

© Website http://www.portugaltimes.com

Naturalmente, o General perdeu as eleições e acabou por ser morto à má fé na fronteira. Permaneceu na memória colectiva como o homem que se atreveu a desafiar abertamente o regime salazarista, e ficou-nos gravado no peito este imenso orgulho de sermos tripeiros.
Como chegar lá: a estação de metro São Bento fica a 10 minutos a pé.

Miradouro da Vitória

© www.webook.pt

Nos dias de Verão existe diariamente uma autêntica procissão de visitantes que desce a lindíssima Rua de São Bento da Vitória em direcção ao miradouro da Vitória, um dos locais históricos do Porto.
A falta de condições do local – a ameaça de pregos e pedaços de ferro é constante e já me magoei lá diversas vezes – é largamente compensada pela vista daquele que é um dos miradouros mais bonitos do Porto.
O que poucos sabem é que o terreno, que actualmente pertence à sociedade construtora Maranhão, já foi palco de muitas histórias. O miradouro, cujo nome oficial é Largo da Bataria da Vitória, foi mandado construir pelo empreendedor (e tão esquecido!) João de Almada nos finais do século XVIII.

© www.porto24.pt

Anos depois seria um dos pontos fundamentais da defesa das tropas liberais, espartilhadas no Porto durante o longo e duríssimo cerco de 1832 – 33. Era precisamente aqui que estavam localizados os canhões das tropas de D. Pedro IV (primeiro emperador do Brasil), apontadas ao coração do seu irmão D. Miguel.
A Maranhão assegura que, se o edifício a que pertence o terreno ficar nas suas mãos, o acesso ao mesmo continuará a ser gratuito. Mas quem sabe até quanto tempo estará aquela vista divina ao alcance de todos, e não apenas aos turistas endinheirados que frequentarão o hotel que lá se adivinha?…
Como chegar lá: a estação de metro São Bento fica a 10 minutos a pé.

Ponte Luiz I (local da antiga Ponte das barcas)

© Website www.bomdia.eu

A bela ponte Luiz I está precisamente no local onde se deu o famoso desastre da ponte das barcas, sendo por isso um dos locais históricos no Porto.
Contextualizando um pouco, para quem não é daqui: ao longo dos séculos existiram diversas pontes das barcas, que permitiam a circulação de pessoas e de mercadorias entre as cidades de ambas as margens do rio Douro. O nome – ponte das barcas – devia-se precisamente ao facto de ser constituída por 20 barcaças unidas por cabos, conferindo uma imensa flexibilidade à construção, que podia ser desmontada para passagem de embarcações. A de que escrevo neste artigo foi a construída em 1806, que teria uma vida curtíssima.

© Website Monumentos Desaparecidos

Em Março de 1809, estava a família real portuguesa lá longe no Brasil, deu-se a segunda invasão francesa. A má fama das tropas francesas, que haviam espalhado o caos e o terror na sua conquista de Braga, não chega para que o Porto entregue as chaves da cidade ao Marechal Soult. Assim, No dia 29 desse mês as tropas francesas entravam no Porto, desbaratinando, em poucas horas, as linhas defensivas da cidade.
A população foge, desesperada, em direcção ao rio Douro. A ponte das barcas não foi suficiente para sustentar o desespero de milhares de fugitivos, tendo sucumbido ao seu peso. Estimam-se em 4.000 o número de mortos desse terrível dia para o Porto.
A cidade ainda hoje recorda o desastre das pontes das barcas nas Alminhas das Pontes, onde velas ardem, perpetuamente, desde há 200 anos, pela alma dos que encontraram as mortes nas águas do rio.
Uma forma original de ver a ponte Luiz I é apanhando o Cruzeiro das 6 pontes. Também pode combinar várias actividades, como por exemplo o Cruzeiro das 6 Pontes, a visita às caves de vinho do Porto e um passeio de ônibus turístico.
Como chegar lá: a estação de metro São Bento fica a 15 minutos a pé.

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Centro Português de Fotografia

© Website www.heyporto.com

A Cadeia da Relação marca precisamente o local onde era a afamada Porta do Olival, da antiga muralha fernandina, bem como o início da última judiaria do Porto.
O Tribunal da Relação do Porto foi instituído em 1582, mas só viria a ocupar a antiga Cadeia da Relação, também ela mandada construir por João de Almada, em 1796. A propósito da cadeia encontrei um texto interessante no blog Porto Arc, cuja autoria desconheço, mas que gostaria de partilhar convosco:

No espaço destinado à Cadeia os planos obedeceram às concepções punitivas que vigoravam ao tempo, sendo evidentes as preocupações com a segurança nas grossas paredes de granito, nas grades duplas do piso térreo, nas portas chapeadas a ferro, etc. As áreas de detenção distribuíam-se da seguinte forma: – No primeiro piso, ao nível do rés-do-chão, situavam-se as enxovias – de Stª Teresa, de S. António, de S. Victor, de Stª Rita, do Sr. de Matosinhos e de Stª Ana – lajeadas originalmente de granito, escuras, húmidas e frigidíssimas, com acesso apenas por alçapões situados no andar superior; – No segundo piso, situavam-se os salões de Nª. Srª do Carmo e de S. José e a saleta das mulheres, também espaços colectivos mas mais salubres; – No último piso ficavam os quartos de Malta, – concebidos como prisões individuais para “pessoas de condição” e que se encerravam apenas durante a noite, – bem como as enfermarias. A distribuição dos presos por estes espaços obedecia a critérios que deviam ter em conta o tipo de crime cometido, o estatuto social do detido e a capacidade para pagar a carceragem. Se bem que a ocupação devesse reger-se pelos Regulamentos existentes, eles foram sistematicamente ignorados e a sobrelotação foi uma das características sempre presente”.
© Website Portoarc
A cadeia da relação viria a tornar-se um dos locais históricos no Porto também devido a alguns dos seus presos mais importantes: o famoso Salteador Zé do Telhado e, acima de tudo, Camilo Castelo Branco, um dos mais famosos escritores portugueses. Camilo, amante de uma mulher casada, Ana Plácido, foi encarcerado na Cadeia da Relação, tendo a história deste amor comovido povo portuense, que lhe perdoou as afeições Miguelistas. Da sua estadia na Cadeia da Relação resultou o livro Memórias do Cárcere. Actualmente o edifício da cadeia é ocupado pelo Centro Português de Fotografia, que faz um pobre trabalho de preservação do espaço e das histórias que lá se passaram (perdoem-me, mas as verdades têm de ser ditas como são). No entanto, vale a pena a visita à Cadeia da Relação para ver uma das mais bonitas clarabóias do Porto.

Como chegar lá: a estação de São Bento fica a 10 minutos a pé.

Museu Militar do Porto (antiga sede da PIDE)

museu militar porto
O Museu Militar do Porto, edifício discreto na zona do Bomfim, albergou durante décadas (desde os anos 40 até 1974) a sede da PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado, o braço armado da ditadura salazarista).
Infelizmente, pouca informação existe sobre a anterior valência deste belíssimo edifício do século XIX, além de uma placa de louvor, na fachada lateral, aos que sofreram às mãos da PIDE.

©
Porto24

O acervo do Museu Militar do Porto é sem dúvida muito interessante – principalmente a enorme colecção de soldadinhos de chumbo provenientes de toda a Europa -, mas peca claramente por não ter qualquer tipo de referência à PIDE e à sua presença na cidade do Porto.
Se forem visitar o museu dêem também uma vista de olhos no Cemitério do Prado do Repouso, mesmo ao lado. Vale a pena.
Como chegar lá: as estações de metro 24 de Agosto e Heroísmo ficam ambas a 15 minutos a pé.

Hotel Teatro (antigo Teatro Baquet)


Contado ninguém acredita, mas a fachada do Hotel Teatro – um dos meus hotéis preferidos no Porto, por dentro é de uma elegância irrepreensível – esconde uma das maiores tragédias da cidade.
Na noite de 20 de Março de 1888 deflagrou um incêndio de grandes dimensões numa das grandes casas de espectáculo do Porto, o Teatro Baquet, mandado erigir, umas décadas antes, por um alfaiate português regressado de França.
A casa estava cheia, visto estar a decorrer um espetáculo, e o incêndio propagou-se rapidamente, devido aos materiais velhos, altamente inflamáveis e também à temperatura elevada que se fazia sentir lá dentro.
Os espectadores, em pânico, amontoavam-se na escuridão, à procura das fugas praticamente impossíveis, já que o edifício estava necessitado de obras de renovação. Não se sabe ao certo quantas vidas foram ceifadas pelo incêndio do Teatro Baquet (estima-se que será um número entre 90a 130 mortos), mas ficou na memória do povo portuense, sendo por isso o Hotel Teatro um dos locais históricos no Porto.
Como chegar lá: a estação de metro Aliados fica a 5 minutos a pé.

Guarde este artigo para mais tarde:

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