Mais do que uma lista exaustiva de edifícios, apresento-lhe a minha visão sobre Álvaro Siza Vieira, mestre das linhas de silêncios prolongados. Um dos melhores lugares, e aquele que você pode verdadeiramente visitar, é sem dúvida o museu de arte contemporânea de Serralves.
Mas há outros, de facto, numa extensa caminhada pelo Porto. Pelo caminho, passo por dois nomes incontornáveis da poesia portuguesa, António Nobre e o meu estimadíssimo companheiro, Eugénio de Andrade, justamente homenageados por Siza Vieira.
Quem é Álvaro Siza Vieira?
Álvaro Siza Vieira nasceu em 1933, em Matosinhos. Aos 26 anos ingressa na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP) numa tentativa de reconciliação com o pai, já que Álvaro queria ser escultor numa altura em que a engenharia era uma das profissões mais reputadas em Portugal.
(Curiosamente, tive o mesmo problema com os meus pais. Eu queria seguir Letras, eles quiseram que eu cursasse engenharia; cumpridas as vontades alheias, eis que hoje ganho a vida a escrever. A vida dá muitas voltas).
O atelier Famo: descreve assim o percurso do arquiteto português:
Fortemente marcado pelas obras dos arquitetos Adolf Loos, Frank Lloyd Wright e Alvar Aalto, cedo desenvolve a sua própria linguagem, embebida não só nas referências modernistas internacionais mas também na tradição construtiva portuguesa, da qual resultaram obras de grande requinte do modernismo português, dos quais se destaca a Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira. A isto não é alheio o relacionamento muito próximo com o arquiteto Fernando Távora, seu professor, e uma das principais referências da Escola do Porto, com quem colaborou de 1955 a 1958″.
Álvaro Siza Vieira tem obras espalhadas um pouco por todo o mundo, sendo talvez os meus preferidos o edifício “Bonjour Tristesse” (1980-84) em Berlim, o centro cultural e o auditório da Fundação Iberê Camargo (1998) em Porto Alegre.
Apesar da presença internacional, é no Porto e arredores que se concentram as suas grandes obras arquitetónicas, nomeadamente as Piscinas das Marés, a Casa de Chá da Boa Nova e o Museu de Arte Contemporânea de Serralves.
Vamos então descobrir os edifícios de Álvaro Siza Vieira no Porto!
As obras imperdíveis de Álvaro Siza Vieira no Porto
Antes de dar início: se esta lista o deixar curioso sobre as restantes obras de Álvaro Siza Vieira no Porto, pode consultar o mapa o feito pela Ordem dos Arquitectos – Secção Regional Norte, com as moradas de todas as obras do mestre no Grande Porto.
1958 – 1963: Casa de Chá da Boa Nova
Avenida da Liberdade, 1681 | Leça da Palmeira | Ter – Sáb 12h30 – 15h e 19h30 – 23h
Talvez a obra mais conhecida de Siza Vieira no Norte de Portugal, a Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira, tem a singularidade de estar construída sobre as rochas do Atlântico, em desafio constante aos elementos marítimos.
Naquela época, o projeto foi concedido ao famoso arquiteto português Fernando Távora, que atribuiu o projeto a um de seus jovens assistentes, precisamente Álvaro Siza Vieira. Logo se tornou o edifício mais famoso de Álvaro Siza Vieira no Porto.
Neste momento, alberga um restaurante de luxo do chef Rui Paula.
Como chegar lá: apanhe o autocarro 507, pois ele pára muito perto da Casa de Chá da Boa Nova. Caso contrário, apanhe o metro até à estação Mercado (linha azul) e de lá apanhe um táxi / Uber.
1961 – 1966: Piscina das Marés
Avenida da Liberdade | Leça da Palmeira | Época Balnear 9h – 19h
Vizinhas da Casa de Chá da Boa Nova, as Piscinas das Marés fazem um blend in perfeito com o seu habitat marítimo, oferecendo, simultaneamente, um mergulho salgado protegido dos caprichos do mar. Nesta fotografia é bem visível a mestria com que Álvaro Siza Vieira incorpora as rochas como elemento arquitetónico das piscinas.
Neste momento as Piscinas das Marés estão encerradas para renovação, e a sua reabertura está programada para o Outono de 2020.
Como chegar lá: apanhe o autocarro 507, pois pára muito perto da Piscina das Marés. Caso contrário, apanhe o metro até à estação Mercado (linha azul) e de lá apanhe um táxi / Uber.
1970: Remodelação do Supermercado Unicoope Domus
Rua de Pedro Escobar | Porto
Escondidíssimo, este antigo supermercado (um dos primeiros do Porto!), recentemente renovado (para que futuro uso?), prova viva de que os mestres se celebram e se esquecem em toda a parte.
Como chegar: apanhe o elétrico nº 1 e depois caminhe até esse prédio abandonado.
1973 – 77: Bairro da Bouça
Lapa | Porto
Segundo o website monumentos.gov.pt, o bairro da Bouça é um conjunto arquitetónico residencial e familiar, de promoção pública estatal, no âmbito da actividade do Serviço de Apoio Ambulatório Local (Operação SAAL).
É um conjunto de grande dimensão, composto por edifícios multifamiliares em banda de quatro pisos, formando quarteirões abertos às ruas adjacentes.
Como chegar lá: a estação de metro da Lapa fica a 1 minuto a pé.
1980: Monumento de homenagem ao poeta António Nobre
Jardim de João Chagas | Leça da Palmeira
Monumento singelo de homenagem a António Nobre, mesmo em frente à Casa de Chá da Boa Nova, onde se pode ler:
“farto de dores com que o matavam / foi em viagem por esse mundo”
Como chegar lá: apanhe o autocarro 507, pois pára muito perto da Piscina das Marés. Caso contrário, apanhe o metro até à estação Mercado (linha azul) e de lá apanhe um táxi / Uber.
1986: Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto
Via Panorâmica Edgar Cardoso, 215 | Porto
A chamada “Escola do Porto” é uma corrente do modernismo arquitectónico português, assente na Faculdade de Belas Artes do Porto e na Faculdade de Arquitetura do Porto, que deu ao mundo arquitetos como Eduardo Souto de Moura (Pritzker 2011), Fernando Távora e Álvaro Siza Vieira (Pritzker 1992).
Construído entre 1985 e 1996 por Álvaro Siza Vieira no Porto, e usando as palavras de Eduardo Souza no ArchDaily, “o conjunto é composto por 10 volumes diferentes, cada um com características próprias, mas que encontram a sua identidade através da cor, opacidade e soluções construtivas”.
Incluo a Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto nesta lista porque me parece digna de louvor a contribuição de um cidadão, na justa medida das suas capacidades, à cidade que o viu nascer e crescer como homem e profissional.
Como chegar lá: a estação de metro Casa da Música fica a 10 minutos a pé.
1991 – 1999: Museu de Arte Contemporânea de Serralves
Rua Dom João de Castro, 210 | Porto | Seg – Sex 10h – 18h Sáb, Dom e Feriados 10h – 19h
Gosto particularmente do Museu de Arte Contemporânea de Serralves pelo espaço, pelos silêncios, pelas múltiplas possibilidades de Estar em Arte, proporcionadas pelo traço envolvente de Siza Vieira.
Se for visitar o museu e não quer esperar na fila para comprar o bilhete, tem a opção de comprar o bilhete online para Serralves.
Uma vez lá, não deixe de visitar o belo parque, projetado pelo arquiteto paisagista Jacques Gréber. O projeto, cujos desenhos datam de 1932, caracteriza-se por um classicismo modernizado, ligeiramente Deco, influenciado pelos jardins franceses dos séculos XVI e XVII.
Como chegar: apanhe o metro para a estação Casa da Música e de lá, apanhe qualquer autocarro que desça a Avenida da Boavista.
1996: Estação de metro de São Bento
Praça Almeida Garrett | Porto
Na estação de metro de São Bento (não confundir com a estação de comboios!), seduzem-me, acima de tudo, os desenhos de Siza Vieira nas paredes – existe um, do lado direito de quem desce as segundas escadas rolantes em direcção à linha de metro, que me encanta particularmente, por representar, em dois ou três traços, uma belíssima ponte sobre o Porto.
Como chegar lá: é a própria estação de metro de São Bento 🙂
2006: Casa Atelier da artista Armanda Passos
Avenida do Marechal Gomes da Costa, 1074 | Porto
Armanda Passos é uma importante artista que nasceu no Peso da Régua, em 1944. Em 2006, Álvaro Siza Vieira projetou o seu atelier no Porto.
Alguns leitores já entraram em contato comigo a perguntar-me como visitar esta obra específica de Álvaro Siza Vieira no Porto, mas, tanto quanto sei, não está aberto aos visitantes e eles não respondem a e-mails ou telefonemas. Uma pena!
Como chegar: fica muito perto do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, por isso pode seguir as mesmas instruções para chegar lá. Pode também apanhar os autocarros 203 ou 207, que param do outro lado da rua.
2005: Jazigo do poeta Eugénio de Andrade
Cemitério Prado do Repouso | Porto
Eugénio de Andrade fez-me sempre companhia nas ocasiões simples. Um poeta assim, humilde e cheio, só poderia descansar num jazigo de neve, ausente de símbolos religiosos ou outros que não as palavras inocentes e secretas, de sempre. No Cemitério do Prado do Repouso, entre brisas de silêncio, pode-se ler:
“Terra: se um dia lhe tocares
o corpo adormecido,
põe folhas verdes onde pões silêncio,
sê leve para quem o foi contigo.”
Como chegar lá: as estações de metro Heroísmo e 24 Agosto ficam ambas a 5 minutos a pé do Cemitério do Prado do Repouso.